A procura de crédito habitação em Portugal tem sido moldada pelo contexto de elevadas taxas de juro e baixo poder de compra sentido no último ano. As famílias têm vindo a comprar casas a preços mais baixos e a pedir menores montantes nos empréstimos. Mas no arranque de 2024 esta tendência foi interrompida: os dados do relatório trimestral do idealista/crédito habitação revelam que a compra da primeira habitação avançou por um preço 11,3% mais elevado face ao início de 2023. E o montante de crédito habitação contratado subiu 12,7%. Esta recuperação do mercado hipotecário português surge numa altura em que a descida das taxas Euribor está à vista e houve um alívio no cálculo das taxas de esforço.Comprar aquela que é a primeira casa voltou a ser o principal destino de contratação de crédito habitação em Portugal no início de 2024, representando 50,8% do total de escrituras. Esta é a primeira mudança que salta à vista no relatório do idealista/créditohabitação relativo ao primeiro trimestre deste ano. Isto porque no final de 2023 os empréstimos para a compra da primeira habitação foram ultrapassados pelas transferências de crédito (pesaram 35,5% e 38% do total de contratos nesse período, respetivamente). Agora, as transferências de crédito pesam 27,9% no total, sendo o segundo tipo de operação mais expressivo, seguido dos não residentes (13,9%) e de segunda habitação (6,6%).
O que também se assistiu em Portugal em 2023 é que as famílias estavam a
comprar casas mais baratas e a pedir menores valores de
crédito habitação à banca, com percentagens de financiamento mais reduzidas (o que pressupõe dar mais capital de entrada), tal como noticiou o
idealista/news. Esta foi uma forma de as famílias que queriam
comprar casa se ajustarem ao contexto de elevadas taxas de juro e baixo poder de compra, que estava pressionado pela
inflação.Mas no arranque de 2024 esta tendência não se observou: as famílias que vivem em Portugal estão a contratar
créditos habitação de valores mais elevados para
comprar casas mais caras. Olhando para as características dos créditos para a
compra da primeira habitação contratados entre janeiro e março de 2024 através do
idealista/créditohabitação observa-se que:
Preço das casas sobe: valor médio para aquisição de habitação principal foi de 240.438 euros no primeiro trimestre de 2024, um valor 11,3% superior ao registado no mesmo período de 2023 (216.000 euros). Face ao trimestre anterior, registou-se um aumento de preços das casas compradas de 8,7%;Maior montante dos créditos habitação: o valor médio dos créditos habitação formalizados foi de 169.400 euros, mais 12,7% face ao registado no mesmo período de 2023 (150.257 euros) e mais 6,6% face ao trimestre anterior;Mais financiamento entre 80-90%: 57,1% dos créditos para compra da primeira casa tiveram financiamentos mais elevados no início de 2024. Já no mesmo período de 2023 só 54,8% dos empréstimos foram financiados pela banca entre 80% e 90%. No trimestre anterior, foram apenas 51% que contaram com maior financiamento bancário.A tendência é semelhante tendo em conta a totalidade de
créditos habitação formalizados no primeiro trimestre de 2024 (ou seja, para primeira habitação, transferências, não residentes e compra de segunda casa, entre outros): o preço de compra da casa médio subiu 2% em termos homólogos (para 232.956 euros); o
montante de crédito habitação aumentou 10% (para 162.112 euros); e o financiamento bancário entre 80-90% abrangeu 47,7% dos contratos no início de 2024, mais do que no período de 2023 (38,6%). Também o financiamento médio aumentou de 72% no início de 2023 para 76% no arranque deste ano, mostra o relatório.
Acompanha toda a informação imobiliária e os relatórios de dados mais atuais nas nossas newsletters diária e semanal.Das taxas mistas ao alívio do teste stress: o que está a impactar o crédito habitação?O facto de as famílias portuguesas estarem a
comprar casas mais caras e a contratar
créditos habitação de valores mais elevados no início de 2024 face aos trimestres anteriores pode estar a refletir uma maior confiança no mercado hipotecário, que tem sido reforçada por vários fatores como:
Euribor oscila e poderá descer em breve: no final de 2023 e início de 2024, as taxas Euribor deram os primeiros sinais de descida em reação à manutenção da política monetária por parte do Banco Central Europeu (BCE) que foi decidida nas últimas cinco reuniões. Ao que tudo indica, o BCE deverá descer as taxas diretoras em junho, trazendo maiores reduções às taxas Euribor a partir desse mês, segundo os especialistas;Taxas mistas mais acessíveis: antecipando a queda da Euribor, há cada vez mais bancos em Portugal a oferecer taxas mistas por valores mais baixos de forma a incentivar a contratação de créditos habitação. Isso ajuda a explicar o facto de 76% dos créditos habitação em Portugal terem sido contratados a taxa mista no início de 2024 (há um ano esta percentagem era de apenas 19%);Alívio no teste de stress: o teste de stress que entra no cálculo da taxa de esforço para os créditos habitação a taxa variável e mista (para período variável) passou de 3% para 1,5% a partir de meados de outubro. Esta alteração facilita o acesso ao crédito habitação, permite aceder a maiores percentagens de financiamento e pedir valores no empréstimo mais elevados;Inflação a estagnar perto dos 2%: a subida generalizada dos preços em Portugal fixou-se nos 2,3% em março, o que ajuda a aliviar o poder de compra e a dar mais confiança a quem quer comprar casa ou investir em imobiliário. Recorde-se que um ano antes a inflação em Portugal estava bem mais elevada, nos 7,4%;Mercado de trabalho resiliente: o emprego no país continua estável, assegurando rendimentos às famílias que querem comprar casa. Aliás, quase 85% das pessoas que contrataram crédito habitação em Portugal no início de 2024 tinham contrato de trabalho permanente e 10% eram funcionárias públicas.Além destes fatores, importa recordar que as
casas à venda continuam a ficar mais caras em território nacional (embora a menor ritmo), tendo o
preço subido 1,9% nos primeiros três meses de 2024 face ao trimestre anterior, segundo o índice de preços do idealista. Com esta evolução, o custo mediano de
comprar casa em Portugal fixou-se nos 2.610 euros por metro quadrado (euros/m2) no final de março. Os elevados preços da habitação também podem, assim, influenciar a
aquisição de casas por valores mais elevados.
Famílias com salários mais baixos continuam a contratar menos crédito habitaçãoHá tendências que continuam a sentir-se no mercado de
crédito habitação português. Desde logo, a maioria das escrituras voltou a ser assinada por pessoas com idades entre os 25 e os 45 anos (cerca de 75%) no início de 2024, o que ajuda a explicar o facto de a idade média dos compradores (38 anos) ter sido semelhante à do período homólogo (39 anos).Depois, “continua a predominar uma situação de
emprego estável, uma vez que mais de 90% dos proponentes têm um contrato permanente ou são
funcionários públicos”, lê-se no documento.O que também parece manter-se é a
tendência de as famílias com
salários mais baixos estarem a contratar menos
crédito habitação. O relatório do idealista/crédito habitação mostra que os agregados com rendimentos médios abaixo dos 2 mil euros representaram 23% do total de escrituras no início de 2024, um peso inferior ao registado há um ano (28%).
Agora, um em cada três
créditos habitação foi assinado por agregados com rendimentos entre 2.000 e 4.000 euros (33%) – há um ano representavam 30% do total de escrituras. E cerca de metade dos agregados que contrataram
empréstimos para comprar casa tinham rendimentos superiores a 4.000 euros. Isto ajuda a explicar o facto de o rendimento médio das famílias ter sido de 3.708 euros no início de 2024 e, portanto, mais elevado que há um ano (3.428 euros).“As
famílias de
rendimentos mais baixos (até 2.000 euros) registam um endividamento relativamente mais elevado, de cerca de 30%, sendo a média global de 23%”, destaca o relatório. A verdade é que tanto os agregados de salários mais baixos como agregados de rendimentos médios (entre 2.000 e 4.000 euros) têm a mesma percentagem de endividamento no arranque deste ano (29%). Já há um ano quem auferia
salários mais baixos tinha uma taxa de esforço de 31% contra 25% das famílias com rendimentos num patamar acima.